terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Mude, ou Quase Isso


Escrever não é uma coisa muito difícil, mas fazê-lo bem, aí sim... não é a atividade mais fácil do mundo. Agora, imagine você o problema em que se mete um escritor quando cria um texto que de tão bom e inspirador, dá a alguém a brilhante ideia de tomá-lo como seu. Ou até não tomar para si, mas achar que um outro autor, "mais conhecido", mereça levar os créditos.

Às vezes isso não acontece por maldade (só por burrice mesmo), quando, só pra citar um exemplo, alguém te manda aquele email com uma poesia ou uma crônica dando a ela a autoria de Carlos Drummond de Andrade, William Sheakspeare e até mesmo Clarice Lispector, sem que a pessoa sequer tenha procurado a fonte (ou sem que tenha lido o autor a quem está dando o texto). Ou quando o sujeito dá a um desses autores (além de outros, não citados) a autoria do texto, para que o mesmo seja lido com maior credibilidade. Isso é triste.

O Alessandro Martins, do ótimo Livros e Afins, começou uma campanha contra essa situação, com o nome de Pare de Denegrir o Bom Nome de Grandes Escritores, a qual eu recomendo fortemente que você dê uma olhada.

Mas não foi sobre isso que eu vim falar.

Acredito que mais de uma centena dos meus leitores (risos) deva conhecer o poema "Mude", que foi musicado e lançado pela Sony Music na coletânea Filtro Solar. Isso, aquela mesma onde o Pedro Bial regravou, em 2003, junto com a DM9DDB, a música "Everybody's Free (To Wear Sunscreen)", que foi originalmente produzida pelo cineasta Baz Luhrmann (aquele mesmo, diretor de Romeu e Julieta e Moulin Rouge). Filtro Solar (ou Wear Sunscreen) é parte da obra intitulada "Advice, like youth, probably just wasted on the young" de autoria de Mary Schmich e que foi publicada como uma coluna, no Chicago Tribune, em 1997. Mas, também não foi sobre isso que eu vim falar (e já se foram tantos parágrafos...).

Antes de abordar o assunto do dia, peço desculpas a você, caro leitor, que achou que no texto de hoje eu dissertaria sobre a mudança no cerne do ser... ou quase isso. Acontece que me vi obrigado a fazer um desvio de assunto para uma causa realmente maior (ou quase isso).

O texto de hora era pra ser sobre mudanças e como elas afetam a nossa vida, e aí eu me lembrei dessa música que, na coletânea Filtro Solar foi gravada pela Simone Spoladore. Como eu não sabia a quem pertencia o texto, fui atrás da fonte. Acabei descobrindo que o autor do texto é Edson Marques, um escritor e poeta brasileiro que fez contrato com a Sony Music e permitiu a gravação da faixa na coletânea (que é excelente, diga-se de passagem). O problema é que assim como no caso dos emails que você recebe da Clarice Lispector, a autoria de Mude quase nunca era dada a Edson Marques quando alguém reenviava o email com a letra da música, chegando a darem até o Pedro Bial como o autor (desculpa Bial, mas seu negócio é nave, tripulante e BBB). Edson chegou até a entrar em ação de indenização por quebra de direitos autorias (como você pode acompanhar aqui). Abaixo um trecho do blog onde o autor fala sobre um dos maiores problemas que teve com essa atribuição errônea de sua autoria.
"Como se sabe, a Leo Burnett encontrou o meu texto na internet, acreditou que fosse de autoria de Clarice Lispector, não checou as fontes, usou o poema para "criar" um comercial para a Fiat do Brasil, e divulgou releases à mídia declarando falsamente que o poema "Mude" havia sido escrito por Clarice Lispector. 
Muita gente acreditou.
Até o filho de Clarice Lispector "acreditou". E aproveitou para cometer um delito. Aliás, um crime de falsidade ideológica: assinou um vergonhoso contrato com a Fiat e com a Leo Burnett, "licenciando" o uso do meu poema. O nome desse sujeito inescrupuloso é Paulo Gurgel Valente, primogênito e herdeiro de Clarice Lispector."
Se você não entendeu, explixo: segundo Edson, uma agência de publicidade produziu um comercial para a Fiat utilizando seu poema mas, assim como os seus amigos que reencaminham emails, essa mesma agência ficou com preguiça de procurar a fonte e preferiu usar seus canais de comunicação para vazar a informação de que o poema não pertencia a Edson e sim a Clarice. O filho da grande escritora se aproveitou da situação e deu no que deu. Ou seja, a coisa ficou tensa.

É aí que entra o título do texto. Eu quero propôr que você mude. Mas não da forma como eu ia fazer, utilizando partes do texto original do Edson, para falar mais (em quantidade, não em qualidade) sobre o hábito de mudar, de fazer diferente...

Vou propôr que você mude o hábito de encaminhar email sem checar de fato o autor do texto (isso claro, caso você tenha esse costume), porque este pequeno ato pode acarretar um problema muito grande a alguém. Quando você encaminha um email, muito raramente o faz para uma pessoa só. Logo, se você encaminha um texto de autoria errada, está ensinando 5 amigos, que ensinarão a outros 5 a falsa autoria de um texto, e assim por diante. Se não acredita em mim, leia na Veja, clicando aqui (como assim, você não acredita em mim mas acredita na Veja? Logo na Veja, poxa?).

Uma solução simples, se você não sabe quem é o autor e também não quer procurar saber, é dar o texto como Autor Desconhecido (apesar de eu achar que o mínimo que você pode fazer com alguém de quem você curtiu um texto e quer repassá-lo é dar-lhe os devidos créditos).


Em 2006, Edson publicou "Mude", como um livro com 96 páginas, pela Panda Books.
Eu ainda não o li, mas depois de toda essa controvérsia, certamente ele pulou pro topo da minha lista, deixando simplesmente Nick Hornby e Stieg Larsson lá embaixo.

Caso queira comprar o livro de Edson (que custa baratinho, sério mesmo) clique aqui para ir ao site da Livraria Cultura e aqui o site da Livraria Saraiva (essa segunda, eu não recomendo, não... mas tái.).

Termino o texto de hoje com um breve trecho do que vem na quinta-feira, onde prometo abordar esse tema como queria ter feito. Peço desculpas a vocês novamente por desviado do assunto. Deixo esse trecho do texto dedicado especialmente a quem pensou "tô nem aí, não sei quem escreveu e encaminho assim mesmo".

"só o que está morto não muda"

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